Blade Runner 2049 | Questões existencialistas em um mundo altamente tecnológico

Preciso dizer que Denis Villeneuve já tinha me impressionado em A Chegada (2016), obra na qual o diretor abordou muito bem questões humanas, mas o vislumbre aumentou ainda mais com Blade Runner 2049, o diretor não só retorna com as questões humanas, como utiliza a sutileza ao retratar isso. O longa é baseado no livro Androides Sonham com Ovelhas Elétricas? do Philip K. Dick e a história inicia 30 anos depois do primeiro: Blade Runner: O caçador de andróides (1982).

Vamos a sinopse?

Após os problemas enfrentados com os Nexus 8, uma nova espécie de replicantes é desenvolvida, de forma que seja mais obediente aos humanos. Um deles é K (Ryan Gosling), um blade runner que caça replicantes foragidos para a polícia de Los Angeles. Após encontrar Sapper Morton (Dave Bautista), K descobre um fascinante segredo: a replicante Rachel (Sean Young) teve um filho, mantido em sigilo até então. A possibilidade de que replicantes se reproduzam pode desencadear uma guerra deles com os humanos, o que faz com que a tenente Joshi (Robin Wright), chefe de K, o envie para encontrar e eliminar a criança.

Se o seu antecessor já apresentava muito bem elementos da ficção científica, e mais especificamente do subgênero cyberpunk, Blade Runner 2049 veio não só para se reafirmar nisso, mas para demonstrar uma evolução, na época que O caçador de Androides lançou, não se tinha todas as tecnologias que conhecemos hoje, não vemos a qualidade de roteiro e direção se perder, vemos na sequência uma perfeita exploração de toda essa tecnologia para exaltar ainda mais a trama incrível escrita por Philip.

Imagine viver em uma realidade, onde a autoridade toma forma com a vigilância e a opressão, imagine o que todo o progresso trouxe consigo, cidade com grandeza em prédios, mas pessoas vivendo em atmosferas cada vez mais frias, poluídas e sufocantes. Cada vez mais cheio de pessoas, mas em meio a toda agitação, há só vazio. Imagine se sentir vigiado, pois há carros voadores patrulhando o tempo todo, o longa retrata tudo isso e até um pouco mais.

Há, em todo o filme, a questão do que é ser humano, do que não é, temos o questionamento do existencialismo através do Policial K, presenciamos toda a busca do personagem pela sua origem, por querer pertencer e ser real, tudo isso numa tentativa de fuga de uma forte solidão, tentando entender o que é e qual seu lugar no mundo. É incrível todo o contraste que Villeneuve faz uso para contrapor e conflitar o que é ser humano, do que é ser android e/ou de só “existir” no mundo digital, um grande exemplo disso é a cena em que une a holográfica Joi com uma prostituta a fim de tornar real a experiência sexual dela com o K ou também a cena em que Joi propõe dar um nome a ele, Joe, pois ele é especial e ela sempre soube. Vemos o quanto importa para eles ser nascido e não criado, em uma tentativa de se tornar palpável sua existência. Os questionamentos levantados, por vezes, são densos e profundos, nos convidando a naquele momento, e até depois, refletir.

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Dentro da narrativa do que é ser humano, utilizam a memória para também contrastar o que é real, do que não é, uma vez que nossas memórias não são necessariamente experiências reais, pois é comprovado que guardamos um pouco da nossa própria perspectiva daquele momento, então como podemos determinar se replicantes não são humanos? Voltamos para a questão da identidade, a busca de compreender o que eles são acaba por colocar em cheque o que somos. Senti durante o filme que o conflito e a busca de uma jornada interna do protagonista expressam a necessidade de que a gente repense: replicantes não podem ser reais no que tange humanidade?

Quando K, ou melhor, Joe entra em conflitos internos e confrontos com sua realidade, isso também é um convite para que façamos o mesmo.

Os contrastes de cor, iluminação e elementos cenográficos também revelam diversas realidades, lugares e sensações. Louvável seja a direção de arte de Blade Runner 2049 que, inclusive, vai ter um post específico aqui devido ao quanto trouxe realidade e concretude para o universo escrito por Philip.

A filosofia está em cada parte, mesmo que de forma sutil, se parar e analisar está ali, bem presente e junto disso se encontra a alta tecnologia, todo o cenário é construído em cima disso e de sua decadência. Falando nisso, a sutileza deixa sua marca em Blade Runner 2049, os aspectos tocantes da trama se apresentam nesse formato, as sensações e sentimentos, seja nossos ou dos próprios personagens, são expressos com tamanho cuidado, por vezes, até com certa delicadeza, mas carregado em profundidade, realismo e “humanidade”. Sendo assim, elucida o drama que o roteiro possui.

Temos a sensação de que aquela realidade existe e de que há um mundo além daquele que estamos presenciando pela perspectiva do protagonista, isso é devido a imersão, algo que Villeneuve conseguiu realizar com tamanha destreza. É também graças ao figurino incrível, a direção de arte impecável e trilha sonora espetacular de Benjamin Wallfisch e Hans Zimmer – obviamente – que temos uma experiência única enquanto estamos assistindo.

Elementos neo-noir marcam presença, mas com um pouco mais de tonalidade, o feito de luz e sombra é empregado em diversas cenas e na maioria das vezes nos remete a Blade Runner: O caçador de Androides, que fez uso demasiado do neo-noir , fazendo, portanto referência e homenagem ao seu antecessor.

Mas, enfim, Blade Runner 2049 é um longa que retrata uma realidade cruel, de uma maneira crua e totalmente fria, abordando temáticas que trazem sensações de angústia e até mesmo de tristeza. Nos entregam uma trama densa e ao mesmo tempo retratada, de forma sutil, com uma complexidade e profundidade, que nos imerge em seu universo. Temos o realismo em meio a todo um cenário futurístico e distópico que juntamente com uma fotografia de encher os olhos e temáticas humanas, conflitos de identidade e crítica a forma de sociedade opressiva contribuem em peso para que o longa seja uma obra prima não só da ficção científica, mas da arte.

Então, tagarelem comigo, gostam de Blade Runner? As temáticas abordadas no filme agradam vocês?

Até a próxima tagarelice e lembrem-se antes mesmo de saber
o que somos, tememos deixar de ser.

4 Replies to “Blade Runner 2049 | Questões existencialistas em um mundo altamente tecnológico”

  1. Este comentário é excelente, tem uma perspectiva interessante sobre o filme. Blade Runner 2049 é um filme com um tema futurista que nos dá uma perspectiva diferente do que poderia acontecer Denis Villeneuve tem uma forma especifica de dirigir e levar o espectador passo a passo com a história. O roteiro do filme foi muito original, um dos aspectos mais notável desta produção foi a trilha sonora. Hans Zimmer y Benjamin Wallfisch fizeram um trabalho incrível em trilha sonora Blande Runner. Adorei a seleção que fez, por que conseguiu acompanhar a perfeição cada situação do filme, realmente vale a pena todo o trabalho que a produção fez, cada detalhe faz que seja um grande filme. Maravilhosa produção, todos os elementos deste filme estão muito bem cuidados, la recomendo.

  2. Meu contato com a sétima arte era muito raso, até porque eu comecei a realmente ter acesso depois de mais velha. Para falar a verdade eu não tinha reparado o quanto esse mundo é tão mais abrangente que eu imaginava começar assistir canais no youtube que exploram o universo dos filmes. Quando vi o trailer desse filme fiquei muito curiosa porque quando o negócio é distopia atrai bastante a minha atenção! Não sabia da existência do livro, mas agora vou querer ler antes de ver os filmes! Ótima análise do filme, parabéns pelo post!

  3. Eu só li o livro, não consegui assistir o filme ainda. Gosto muito desses questionamentos que o livro trás, mas é claro que por ter sido escrito em outra época, acompanho em algumas problematizações que me incomodam um pouco. Eu não gosto tanto da escrita do Dick, mas pretendo ver o filme urgente.

    vidaemserie.com

  4. Eu não li e nem assisti o filme, na vdd, só descobri sua existência, pois minha orientadora comentou comigo, mas nem animei. Agora com essa 'resenha' eu super curti, parece ser muito mais do que simplesmente 'robôs e suas questões existenciais manjadas', tão classico. Puxa, super quero ver! Adorei o texto, beijos.

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