Um Lugar Silencioso | A tortura por meio do silêncio

John Krasinski, o tão conhecido Jim de The Office, não estreou como diretor, como muitos tem pensado, o ator já tinha dirigido outros dois longas, Família Hollar e Brief Interviews with Hideous Men, ambas do gênero comédia, além disso, dirigiu alguns episódios de The Office. O roteiro é assinado por Bryan Woods, Scott Beck e o próprio John Krasinski assinou a versão final, tendo feito algumas alterações do roteiro inicial. Um lugar silencioso tem apenas 90 minutos de duração, ou seja, bem rapidinho. Quando menos esperamos acabou, o que auxilia tal impressão é a qualidade do filme ao nos envolver em sua narrativa e atmosfera.

Sinopse:

Aqueles que sobreviverem, vivem sob uma única regra: não fazer nenhum barulho. Em uma fazenda nos Estados Unidos, uma família do Meio-Oeste é perseguida por uma entidade fantasmagórica assustadora. Para se protegerem, eles devem permanecer em silêncio absoluto, a qualquer custo, pois o perigo é ativado pela percepção do som.

O elenco é pequeno, sendo focado em um núcleo de família, então temos Emily Blunt, como a mãe; John Krasinski, como o pai; Millicent Simmonds, Noah Jupe e Cade Woodward, como os filhos. A escolha de um elenco menor foi importante para o tipo de história, o enfoque nessa família nos permite em 90 minutos adentrar na intimidade e cotidiano deles, em conhecer cada um, de forma, bem completa. Algo extremamente importante foi contratar uma atriz, a Millicent, com deficiência auditiva para uma personagem que tem a mesma condição. Isso também auxiliou em outro aspecto do filme, desde o inicio já nos deparamos com o silêncio, a fala é bem rara, pois a sobrevivência deles dependem da ausência dos sons, então, a comunicação entre os personagens se dá por meio da língua de sinais e isso mostra-se bem presente tanto devido a atriz quanto a personagem, os demais pertencentes do elenco aprenderam realmente a linguagem de sinais. Interessante e necessário, né?

Quanto a atuação, cada um deles, dá um show. As expressões de sentimentos e emoções, como medo, dor e desespero tiveram que ser passadas sem o uso de interjeições e palavras, exigindo assim um alto nível de habilidade, o que podemos conferir com exatidão. Principalmente, com relação a Emily, que numa das sequências mais tensas do longa, entrega toda a angústia e dor que está passando naquele momento em ter que sentir tudo sem poder ao menos gritar. 
O silêncio não se fez apenas presente na história, mas também mostrou-se na sala de cinema, com os espectadores, todos os presentes fizeram o mínimo de silêncio possível, pois para comer sem fazer nenhum ruído seria necessário uma mágica, mas foi uma das sessões mais silenciosas que já estive, isso porque toda a dinâmica da trama requer uma atenção redobrada, pois por não ser dita, as coisas são mostradas, outros recursos são explorados, como efeitos sonoros e visuais, assim como a própria fotografia intervem para causar e dizer o que a cena precisa transmitir. Grande exemplo disso, é o uso das luzes piscando em determinadas situações; lugares escuros com luz vermelha refletida na água para demonstrar ainda mais o desespero daquele momento, além de retirar toda a luz em pequenas circunstâncias em que os personagens estão se escondendo, é genial. Em determinados lugares a fotografia é escura mesmo, densa, como se houvesse pouca iluminação e, de fato, há, estamos falando de um futuro onde não há o grande número de pessoas, nem se sabe quantas estão vivas, as coisas estão abandonadas. A própria eletricidade é um recurso para ser usada com sabedoria, pois não há mais uma sociedade em que as pessoas produzem ela. 
Temos o som no seu formato natural, por meio da própria natureza, a correnteza da água, o vento correndo, os passos dados em meio a grama ou areia, são sons naturais tanto por  vir da natureza quanto por serem absorvidos pelo nosso ouvido cotidianamente, como o som baixo que nossos pés fazem, o som da nossa respiração e até mesmo quando manuseamos objetos. É uma sutileza muito bem aplicada, que traz um aspecto diferenciado para a história, despertando, inclusive a imersão de nós. espectadores, com aquela realidade e com aqueles personagens, pois a empatia para com ele se faz extremamente necessária, do contrário como poderíamos sentir a aflição deles na nossa pele, como entenderíamos como aquele mundo é aterrorizador e envolto em tanto medo, em tanta privação, em saber que a qualquer instante, por descuido, a morte pode chegar certeira. Por isso, os elementos de horror apresentados se mostram bem utilizados, sabemos em quais situações tomaremos sustos e ainda assim não conseguimos escapar, isso em grande parte por conta do roteiro e direção que vão nos entregando detalhes, como uma data em um calendário, o prego desgraçado, um prender de respiração e até mesmo uma lanterna caída no chão. São estímulos que nosso cérebro vai recebendo para começar a ficar em alerta, é a famosa ansiedade a nos mostrar que o perigo é iminente. Bem inteligente, diga-se de passagem.

Com Um Lugar Silencioso compreendemos ainda mais a necessidade da comunicação, de um modo geral, seja qual for nosso meio de expressão ele se mostra de extrema importância, somos seres sociáveis que vivemos em sociedade, logo poder compartilhar com os outros o que sentimos, o que estamos passando ou no que estamos pensando, se mostra algo vital. A linguagem, portanto, se revela inerente a nossa espécie, independente de qual linguagem for utilizada, precisamos dela. Muitas vezes, não damos importância ou até mesmo nem sequer temos consciência do poder que ela têm, inclusive a linguagem é utilizada, várias vezes, como forma de subjugar um povo, como forma de inferiorizar um grupo e até mesmo gerar preconceitos. 
As interjeições demonstram a sua importância, por exemplo, quando nos machucamos tanto fisicamente quanto psicologicamente esboçamos uma reação de dor, por meio do grito, do urro, do berro, do palavrão e quando não expressamos dessa forma encontramos outros jeitos, como morder algo, se segurar forte em algum objeto. Mais importante que usar sons, é a expressão, pois iremos nos adaptar a uma forma de poder emitir, mesmo que não seja com palavras, aquilo que estamos sentindo. Precisamos aliviar a pressão de tudo isso que há dentro da gente. Por isso, a escrita se revela também necessária, por ser uma forma de se expressar, uma, dentre as várias ferramentas que temos para utilizar a este fim. O silêncio se encaixa também como uma ferramenta, a ausência da fala, do som, também expressa algo, também quer dizer alguma coisa, o significado que queremos atribuir a ela. Com o silêncio temos acesso muitas vezes, a novos sons ou aqueles não percebidos pela gente antes, por conta do barulho. O que a pinguim quer dizer é que não importa de qual jeito, mas se expressar é algo necessário, temos que achar a melhor maneira para nós mesmos.

O filme traz uma variedade de ensinamentos e de elementos de reflexão, seja por nos mostrar exatamente o quão relevante é a comunicação e nossa expressão, seja por mostrar a magnitude da influência que recebemos da nossa família e vice e versa. Do quanto somos capazes de nos adaptar a diferentes ambientes e situações, usando o que possuímos e tendo boas ideias, fazendo uso do que já sabíamos, mas sempre aprendendo também. Utilizando-se do drama familiar, trabalha com problemas humanos, o dilema de se criar filhos em um ambiente tão perigoso, a dificuldade da maternidade/paternidade. Todos eles, tem seus próprios problemas, sejam eles internos ou não, lidam com a culpa, com o medo, com a rejeição, com toda a bagagem emotiva que carregam, o peso da sobrevivência sobre seus ombros, a perda da segurança, das pessoas que amam.

Enfim, Um Lugar Silencioso é um terror extremamente psicológico, que precisa do total silêncio para ser assistido, para a imersão acontecer. O silêncio em si além de necessário para nossa comunicação e para nós internamente, também se revela uma forte tortura quando somos privados de emitir qualquer ruído, quando isso nos coloca em perigo e vivemos rodeados pelo medo. É um filme que inicia muito bem e termina ainda melhor, mexendo com nossas emoções e brincando com nosso psicológico do começo ao fim, quando encerra sua narrativa é espetacular, tão surpreendente e nos convida a participar também do seu encerramento, cabe a cada um interpretar qual é a melhor forma de terminar. Por fim, o silêncio pode ser aterrorizador.

O longa obtém, portanto:

(5 de 5 pinguins e merece muito ser assistido no cinema)
•••

Tagarelem comigo, vocês gostam de terror psicológico? Já assistiram ao filme? Quais pontos dessa crítica mais te agradou?

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Até a próxima tagarelice e lembrem-se de se manter em silêncio.

6 Replies to “Um Lugar Silencioso | A tortura por meio do silêncio”

  1. Um Lugar Silencioso tem um plot autossuficiente para um filme de terror: a tensão está toda no silêncio, ou no rompimento dele. Se tem uma coisa que eu não gosto nos filmes de terror atuais, são os screamers, e o que eu mais gosto é o terror psicológico. Gostaria que vocês vissem pelos os seus próprios olhos A Coisa o filme Se ainda não viram, deveriam e se já viram, revivam o terror que sentiram. Depois de vê-la você ficara com algo de medo, poderão sentir que alguém os segue ou que algo vai aparecer.

  2. Oie, tudo bem? O filme realmente incrível com relação as discussões que traz consigo. Vi o trailer a primeira vez e confesso que fiquei bem assustada (medo mesmo haha) principalmente pela presença da Emily. Logo lembrei dela em A garota no trem. Não sei porque mas todos os filmes de terror psicológico me fazem pensar em Garota Exemplar. Talvez seja só algo da minha cabeça haha Não sei se assistiria porque sou meio medrosa, quem sabe quando estiver na internet e possa ver em casa haha Beijos, Érika =^.^=

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