Lady Bird | A beleza do cotidiano e do ato de amadurecer

Dirigido por Greta Gerwig, conhecida por desenvolver o roteiro e atuar em Frances Ha, o filme conta com cinco indicações ao Oscar 2018, concorrendo a melhor filme, melhor diretor, melhor atriz, melhor atriz coadjuvante e melhor roteiro original, que deve ser comemorada, pois Greta é a quinta mulher a ser indicada pela categoria em 90 anos da premiação. Lady Bird é seu primeiro trabalho solo como diretora e que tem paralelos com a sua vida pessoal, assim como sua personagem principal, Greta nasceu e cresceu em Sacramento, frequentou uma escola católica e se mudou para Nova York a fim de cursar a faculdade, por isso, dizem que o filme tem um pouco de autobiografia. 

Sinopse:

Christine McPherson (Saoirse Ronan) está no último ano do ensino médio e o que mais deseja é ir fazer faculdade longe de Sacramento, Califórnia, ideia firmemente rejeitada por sua mãe (Laurie Metcalf). Lady Bird, como a garota de forte personalidade exige ser chamada, não se dá por vencida e leva o plano de ir embora adiante mesmo assim. Enquanto sua hora não chega, no entanto, ela se divide entre as obrigações estudantis no colégio católico, o primeiro namoro, típicos rituais de passagem para a vida adulta e inúmeros desentendimentos com a progenitora.

Uma das coisas mais interessante do filme é que temos a experiência feminina representada durante a adolescência, durante seu amadurecimento, sua transformação em uma pessoa adulta, vemos seus acertos, seus erros, suas falhas e para onde tudo isso a vai levar, as consequências chegam e podemos perceber o quanto Lady Bird trilha seu caminho com aprendizado, é errando que se aprende, como dizem, e ela aprende com suas infinitas quedas. Além do mais, é louvável, o fato de que toda essa representação do processo de crescimento feminino, não é pautada em meninos, apenas, não é focado só em sexualizar a personagem principal, temos todas as experiências que a frase proporciona, todos os momentos conturbados e primeiras descobertas, como primeiro beijo, primeira relação sexual, mas tudo isso é retratado de forma natural, como parte da vida, sem que a vida dela gire em torno apenas disso, como presenciamos em muitos filmes com personagens femininas. 
O enfoque do filme é na relação familiar, nos problemas, na dificuldade de se relacionar entre Lady Bird e sua mãe, na falta de comunicação e na barreira que existe em não conseguir expressar o amor que uma sente pela outra, até porque ele está lá, nós vemos que entre os gritos, as brigas e os embates entre duas personalidades diferentes, que tem opiniões distintas e visões opostas sobre a vida, temos os momentos de puro afeto, ternura e até companheirismo. Se relacionar é difícil, ainda mais quando temos que conviver com quem amamos e que possuem diferenças tão grandes, a gente precisa aprender a conviver com elas. 
Lady Bird se dá conta que todo aquele desejo de se distanciar da cidade, da escola e da família, que aquela rebeldia inicial, era uma forma de tentar se desprender, se tornar independente, conseguir ir atrás do seu sonho, sem se sentir culpada de deixar as pessoas que amam para trás, era mais fácil. Mas, ela se dá conta que sente falta daquilo que a torna única e peculiar, seu lar, sua cidade, suas amizades e, principalmente, sua família. É uma descoberta que todos nós passamos, pode ser de diversas formas diferentes, mas que de um jeito ou de outro todos tivemos que encarar, por isso é fácil se identificar com a personagem principal e multiplas vezes até mesmo com os demais personagens, pois eles são a representação do humano, são totalmente humanizados, não temos um vilão, um heroi, temos pessoas que se constroem em cima de erros e acertos, que tem sonhos e dificuldades, que estão tentando ser e viver da melhor maneira possível.
O longa tem apenas 93 minutos e que nem vemos passar, pois Greta desenvolveu tão bem a narrativa, a história dentro daquele mundo, com aquelas pessoas, que percebemos que estamos tão envolvidos com tudo quando acaba e dá um pequeno vazio quando isso acontece. O ponto mais alto da diretora e roteirista é seu olhar atento a cada detalhe, ela construiu o simples, o cotidiano, o dia a dia, de uma forma espetacular, tem honestidade em todo o seu filme. Pode não ser o filme mais original que você já viu, o mais surpreendente ou o mais excepcional, mas isso não quer dizer que ele não deixa de ser essas coisas, a inovação vem por conseguir retratar algo tão banal, algo tão presente na nossa vida, que é o cotidiano e transformar isso em algo tão grandioso, tão bem construído que se inserir naquela realidade não é nem um pouco difícil. A forma de contar é totalmente única, totalmente sincera e que possui um toque particular da diretora, percebemos o seu envolvimento efetivo, seu carinho com o longa.
Outro destaque para Greta é sua capacidade em trazer nuances aos seus personagens, desenvolvemos empatia pela mãe de Lady Bird, pois conseguimos enxergar o seu lado da história, compreendemos a sua dureza, sua tentativa de ter controle, mesmo que possamos não concordar, por estar inseridos em seu mundo, entendemos sua realidade e dificuldades, ela quer dar o melhor para sua filha e a fazer entender a vida em que eles vivem, talvez a forma de se comunicar tenha um problema, elas não conseguem conversar sobre as coisas, mas vemos isso em ambos os lados. E isso é incrível demais, problemas que acontecem na vida real, muitas vezes. O pai dela encontra dificuldades para arrumar emprego, o país se encontrava em uma crise, em 2002, ano em que o filme se passa, por conta disso, ele desenvolve claramente uma depressão, é pouco abordado, mas enxergamos ali, isso nos permite perceber que muitas vezes as pessoas com quem convivemos, tem enfrentado suas próprias batalhas, essas que na grande maioria das vezes são diferentes das nossas. A mãe dela devido a isso tem jornada dupla no trabalho, é enfermeira e tenta dar de tudo para compensar o desemprego do marido. Todos estamos vivendo nossas lutas internas e cotidiana dia após dia e precisamos aprender a assimilar isso mesmo quando estamos fechados nos nossos próprios problemas. 
O nome de batismo de Lady Bird é Christine McPherson, mas ela se autodenomina assim claramente por uma busca de uma identidade única, sua própria vontade de quebrar os laços com aquilo que vem de seu nascimento, de sua origem, isso fica muito claro ao longo do filme, com o decorrer de suas atitudes. Ela erra demais, nem sempre concordamos, mas também não é difícil de a compreender, apesar de nos dar uma vontade de a sacudir, uma vez que outra.
O longa é também sobre autoaceitação, sobre aceitar quem se é em balanço com quem se deseja ser, é sobre entender que sua origem importa, que o que somos é parte grande da gente e que mudar nem sempre é sinônimo de não se gostar, mas de entender que precisamos evoluir, mas também saber que não precisamos detonar nossa personalidade em função do outro ou para ser aceito pelas outras pessoas. a mudança tem que partir do quão melhores queremos ser para nos mesmos. E a aceitação também é proveniente de poder aceitar os outros como eles são, os compreendendo.
Lady Bird é um filme dramático, mas que apresenta certo senso de humor, que não é representado com a presença de piadas, mas com a comicidade dos eventos da vida mesmo. Isso traz ainda mais leveza para o longa e o torna ainda mais interessante de assistir. Outro ponto a se ressaltar é a beleza da fotografia, é usado as localidades de Sacramento para ambientalizar e devo dizer que é muito bem utilizado, temos taques incríveis das paisagens da cidade. 
Quero parabenizar rapidamente, a atuação impecável de Saoirse Ronan, que incorpora muito bem a complexidade e peculiaridade de sua personagem, não consigo imaginar outra pessoa para o papel de Christine (Lady Bird) e também Laurie Metcalf, que interpreta Marion, mãe da Lady, a atriz já demonstrou suas habilidades fazendo o papel de mães com igual complexidade, com diversas nunces, como a mãe do Sheldon na série The Big Bang Theory e agora em Lady Bird consegue brilhar ainda mais, trazendo a caracterização e humanização que sua personagem requer. Não é atoa que as duas estão concorrendo respectivamente a melhor atriz e melhor atriz coadjuvante no Oscar 2018.
Enfim, Lady Bird não é o mais inovador, mas nem por isso devemos questionar o seu mérito ou sua indicação ao Oscar, pois está concorrendo de forma justa, não é porque estamos acostumados com filmes ditos “complexos demais”, onde terminamos não entendendo nada do filme, que aqueles que possuem a simplicidade, honestidade ao retratar as coisas cotidianas, não deve ser valorizado. Inclusive, tem espaço no coração da Pinguim para apreciar os dois, não necessariamente precisa ter no seu, mas respeitar que nem todo tipo de arte vai ser o tipo que você gosta, é importante e necessário saber dar o devido valor até mesmo para aquilo que não gostamos muito. E Lady Bird merece muito valor por seus diálogos bem escritos e marcantes, que falam diretamente com a gente, por gerar reflexão em coisas cotidianas e principalmente por nos trazer a mensagem de que nenhum relacionamento é igual ou perfeito, eles são complexos porque são formados por seres humanos, que apresentam suas próprias complexidades e que todos temos falhas, todos erramos, todos acertamos. Todos de alguma forma já cometemos nossos deslizes, assim como Lady Bird.
Lady Bird é sobre a vida comum, em uma cidade comum, com personagens comuns e isso por si só já é bem extraordinário.
Então, a nota é:
(4,5 de 5 pinguinzinhos)
Tagarelem comigo, vocês gostaram do filme? Querem assistir? Compartilhem comigo suas impressões sobre o filme, vou adorar saber.

Lady Bird faz parte do projeto #52FilmsByWoman

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Até a próxima tagarelice e lembrem-se é hora de voar.

6 Replies to “Lady Bird | A beleza do cotidiano e do ato de amadurecer”

  1. Eu ainda não vi o filme, apenas o trailer. Percebi que sou muito diferente da Lady Bird em personalidade, mas não em todas as dificuldades que passamos nessa fase da vida. É engraçado como podemos ser peculiares até mesmo vivendo de forma comum, uma vez que cada pessoa erra em um ponto e acerta em outro. Gosto muito de filmes assim, sobre o relacionamento entre mãe e filha porque sou muito próxima a minha mãe, e os desentedimentos ainda assim são comuns. Amei a parte em que você pontua que o filme não foca apenas em amadurecimento sexual, porque geralmente essa nuance é a mais explorada nos filmes e não chega perto de ser a única ou mais importante todas. Ansiosa para assistir! Já falei que amo tudo que você escreve? haha

    Beijos da Yana
    Marshmallow Com Café

  2. Não conhecia esse filme e confesso que sinto imenso preconceito com filmes que são indicados ao Oscar, mas me interessei imenso pela história e pelo conceito comum. Acho que todos nós somos figuras comuns, em busca de nuances únicas, um lugar ao sol. E nessa seara de personagens, é bom saber que alguém olha-aprecia-entende e exibe todas essas sonoridades.
    Anotei aqui para ver nesse próximo final de semana.
    bacio

  3. Saorise está cada ano mais brilhando né!!

    Eu amei o filme!! Me empatizei de imediato com a mãe de Lady Bird! Como perdi minha mãe há uns anos esse tipo de filme mãe e filha é algo que mexe bastante com meu coração ainda! Me vi em Lady Bird em tantos e tantos momentos! Na raiva, na angústia e na vontade de ser ela simplesmente ela! O amor e pela mãe e a vontade de se sentir amada pelo que se é e não por ser uma filha!!

    Ainda falta alguns filmes para terminar minha lista de Oscar mas ele está nos meus favoritos!!

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